O Concílio de Constantinopla: Entenda Seus Quatro Encontros e Impacto na Teologia Cristã
Constantinopla, capital do Império Bizantino, foi sede de diversos concílios que moldaram profundamente a teologia e a história da Igreja. Dentre eles, três são reconhecidos como ecumênicos (universalmente válidos para o cristianismo antigo), e um quarto teve forte impacto na relação entre o Oriente e o Ocidente.
Este artigo apresenta os quatro Concílios de Constantinopla, seus contextos históricos, decisões doutrinárias e impacto duradouro na fé cristã.
1. Primeiro Concílio de Constantinopla (381 d.C.)
Contexto Histórico
Após o Concílio de Niceia (325), o arianismo — que negava a divindade plena de Cristo — continuava a se espalhar. Além disso, surgiram novas heresias, como o macedonianismo, que negava a divindade do Espírito Santo.
O imperador Teodósio I, cristão convicto, convocou o concílio em 381 d.C., reunindo cerca de 150 bispos no Oriente.
Principais Decisões
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Afirmação da Divindade do Espírito Santo
Contra os macedonianos, declarou-se que o Espírito Santo é verdadeiro Deus, da mesma essência do Pai e do Filho. -
Ampliação do Credo de Niceia
O concílio confirmou o Credo Niceno e o ampliou para incluir uma seção clara sobre o Espírito Santo. Este texto ficou conhecido como o Credo Niceno-Constantinopolitano. -
Condenação de Heresias
Arianismo, sabelianismo e apolinarismo foram formalmente rejeitados. -
Primazia de Constantinopla
O cânon 3 conferiu à sede de Constantinopla o segundo lugar de honra na Igreja, logo após Roma — ponto que mais tarde geraria tensões com os bispos do Ocidente.
Impacto
Este concílio estabeleceu firmemente a doutrina da Trindade, como uma unidade de três pessoas coeternas e consubstanciais. O Credo recitado ainda hoje em diversas liturgias cristãs tem sua origem aqui.
2. Segundo Concílio de Constantinopla (553 d.C.)
Contexto Histórico
Quase dois séculos depois, a Igreja ainda lutava com as consequências das controvérsias cristológicas. Embora o Concílio de Calcedônia (451) tivesse afirmado que Cristo tem duas naturezas (divina e humana), muitos orientais ainda resistiam a essa definição.
O imperador Justiniano convocou o concílio em 553, buscando reconciliar os calcedonianos e os monofisitas.
Principais Decisões
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Condenação dos “Três Capítulos”
Escritos associados a teólogos ligados ao nestorianismo foram rejeitados. Isso gerou tensão no Ocidente, especialmente entre os bispos africanos e o papa Vigílio. -
Reafirmação do Concílio de Calcedônia
Apesar das condenações, o concílio manteve a doutrina das duas naturezas de Cristo. -
Fortalecimento da Teologia da Encarnação
A obra salvadora de Cristo foi enfatizada como plenamente eficaz por Ele ser verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem.
Impacto
Embora buscasse unidade, o concílio acabou aprofundando a divisão entre Oriente e Ocidente, mas consolidou ainda mais a ortodoxia calcedoniana contra heresias cristológicas.
3. Terceiro Concílio de Constantinopla (680–681 d.C.)
Contexto Histórico
O desafio agora era o monotelismo, heresia que afirmava que Cristo tinha duas naturezas, mas apenas uma vontade — uma tentativa de apaziguar as tensões com os monofisitas.
O imperador Constantino IV convocou cerca de 170 bispos, incluindo legados papais, para enfrentar essa nova crise.
Principais Decisões
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Afirmação de Duas Vontades em Cristo
O concílio declarou que Jesus tem duas vontades e duas energias, correspondentes à sua natureza divina e humana, sem divisão ou confusão.
“Duas vontades naturais e duas operações naturais em Cristo, unidas harmonicamente.”
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Condenação de Heresiarcas
Figuras influentes como Sérgio de Constantinopla e o papa Honório I foram condenadas por apoiar o monotelismo.
Impacto
Este concílio foi crucial para proteger a integridade da encarnação. Afirmar que Jesus tinha uma vontade humana completa, além da divina, era necessário para reconhecer que Ele viveu plenamente como homem, e obedeceu ao Pai em nosso lugar (Hebreus 5:8).
4. Quarto Concílio de Constantinopla (869–870 d.C.)
Contexto Histórico
Menos consensual entre as tradições cristãs, este concílio foi convocado pelo imperador Basílio I e pelo papa Adriano II para lidar com o chamado Cisma de Fócio.
Fócio, um intelectual e patriarca de Constantinopla, foi deposto por razões políticas e eclesiásticas, gerando controvérsia com Roma.
Principais Decisões
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Deposição de Fócio
Reafirmou a autoridade papal sobre o Oriente — o que foi posteriormente rejeitado pela Igreja Ortodoxa. -
Regras sobre eleições eclesiásticas
Fortaleceu a disciplina clerical e a hierarquia institucional da Igreja.
Reconhecimento
A Igreja Católica o reconhece como o oitavo concílio ecumênico. A Igreja Ortodoxa, porém, não o aceita, preferindo o concílio alternativo de 879–880, que restaurou Fócio.
O Legado Teológico dos Concílios de Constantinopla
Os Concílios de Constantinopla foram fundamentais para clarificar e proteger a doutrina cristã ao longo de séculos de debate teológico. Neles, vemos a Igreja afirmando verdades centrais como:
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A Trindade, com Pai, Filho e Espírito igualmente divinos
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A plena humanidade e divindade de Cristo
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A realidade de que Ele possui duas vontades, e agiu plenamente como Deus e como homem
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O desenvolvimento da tradição e da autoridade conciliar
Esses encontros nos lembram que a ortodoxia não é construída sobre opiniões passageiras, mas sobre discernimento coletivo guiado pelo Espírito Santo e enraizado nas Escrituras.
Recursos Recomendados:
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Livro: The Christological Controversy – Richard A. Norris Jr.
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Vídeo: O Que Aconteceu em Constantinopla? – Ligonier Ministries